História de um Brasil sob trilhos
Com uma extensão de 14,5 quilômetros, a primeira ferrovia brasileira foi inaugurada por
Dom Pedro II, no ano de 1854. Apesar de ter sido entregue pelo último imperador do Brasil, a primeira estrada de ferro do país só foi concebida graças ao empenho e forte ação política do empresário e industrial Irineu Evangelista de Souza, mais conhecido como Barão de Mauá.
Esse primeiro trecho, construído pela Imperial Companhia de Estradas de Ferro, ligava o
Porto de Mauá, na Baía de Guanabara (RJ), à Serra da Estrela, próximo à cidade de Petrópolis. Homenageando o seu idealizador, a Estrada de Ferro Mauá trouxe integração entre o transporte aquaviário e o ferroviário e foi o primeiro sistema de transporte intermodal no Brasil. As embarcações atracavam no porto no fundo da Baía de Guanabara e, então, a carga passava para o transporte ferroviário.
Logo depois, outras linhas férreas surgiram no Nordeste, Recôncavo Baiano e, principalmente, em São Paulo. As ferrovias, inicialmente, serviram principalmente à economia cafeeira da época, que se encontrava em franco crescimento.
Entre 1870 e 1920, o Brasil viveu uma verdadeira “Era das ferrovias”, com um crescimento médio de 6.000 quilômetros por década. Em 1900, o Brasil expandiu sua malha ferroviária para 15.316 quilômetros totais. No ano de 1919, o país já possuía 28.128 quilômetros de ferrovias, ou seja, quase o dobro. O Estado de São Paulo foi o que obteve maior expansão, nessa fase, passando a ter 18 ferrovias, o que fomentou o enorme crescimento industrial e agrícola paulista na época.
Era do automóvel
Após 1920, com o advento da era do automóvel, as ferrovias iniciam sua fase de estagnação. Esse movimento se intensifica na década de 30, durante o primeiro governo de Getúlio Vargas, que priorizou as rodovias e colocou as ferrovias em segundo plano.
Assim, o Governo Federal inicia um processo de estatização da malha férrea brasileira, que até então era operada por empresas de capital estrangeiro. Porém, a falta de planejamento governamental acarretou na precarização das estradas de ferro e a expansão ocorre a passos lentos. Para se ter ideia, entre 1940 e 1948, ou seja, quase uma década, as ferrovias só expandiram 1.371 quilômetros.
O modal de transporte ferroviário ganhou um impulso um pouco maior no ano de 1957, quando o então presidente Juscelino Kubitschek assinou a Lei 3.115, que criou a Rede
Ferroviária Federal S.A., uma empresa de economia mista e administração indireta do Governo, que passou a gerir as estradas de ferro de propriedade do Governo Federal.
Em seu governo, JK intensifica os investimentos na malha férrea, sendo que em 1960 chega ao seu ápice com 38.287 quilômetros totais. Mas no período da ditadura militar, que se iniciou em 1964, as ferrovias sofreram um forte encolhimento e vários trechos foram desativados e nossa malha ferroviária foi a menos de 30 mil quilômetros.
Entraves
Um transporte mais rápido, mais barato, menos poluente e que poderia impulsionar a infraestrutura brasileira e reduzir os gargalos logísticos do Brasil. Apesar de todos esses benefícios, somos um país pobre em ferrovias. Com cerca de 30 mil quilômetros em linhas de ferro, ficamos atrás de vários países com extensão territorial bem menor como Argentina, que tem cerca de 34 mil quilômetros, e Alemanha, com mais 43 mil quilômetros de estradas de ferro.
A nossa densidade ferroviária é de 3,1 m/km²; enquanto que os Estados Unidos, maior referência mundial no modal ferroviário, registram 150m/km² e na vizinha Argentina são 15m/km². Outro problema é que temos uma malha mal distribuída e mal situada, quase a metade das ferrovias (47%) estão concentradas no Sudeste do País. As regiões Norte e Centro-Oeste do País, juntas, concentram apenas 8%.
Especialistas do setor apontam vários problemas que emperram os investimentos e a ampliação no modal ferroviário. O principal deles é a falta continuidade nos poucos projetos de planejamento logístico em andamento no país. Como a construção de novas ferrovias é um projeto de longo prazo, esse plano acaba sendo prejudicado pelas trocas de governo no Brasil – que normalmente abandonam projetos antigos em nome de renovação da agenda.
Um exemplo disso é a EF -151, mais conhecida como Ferrovia Norte-Sul, que foi projetada para ser a espinha dorsal do sistema ferroviário do Brasil. Com suas obras iniciadas no ano de 1987, a construção dessa, que é a maior e principal linha férrea do país, já se arrasta a mais de 30 anos. Dos mais de 4 mil quilômetros projetados, apenas 1.537 estão concluídos e em operação.
Situação atual
Nos últimos anos, o atual governo federal vem empreendendo ações no sentido de implantar um programa de reestruturação e ampliação do modal ferroviário no Brasil. A proposta é investir nos próximos cinco ou seis anos um montante na ordem de R$ 30 milhões para concluir obras de ferrovias que estão paradas e iniciar a construção de novos trechos.
Uma dessas ações que já vem sendo desenvolvidas desde 2019 é a antecipação da concessão para exploração de vários trechos da Ferrovia Norte-Sul. Em 2021, também já foram assinados contratos de concessão para exploração da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol) e Ferrovia de Integração do Centro-Oeste (Fico). Também neste ano foram lançadas obras de novos trechos da Fiol e da Fico.
O governo federal também assinou em 2021 a medida provisória (MP) 1065/2021, que institui o novo marco legal do transporte ferroviário. A MP muda o atual regime jurídico do setor, permitindo que a construção de novas ferrovias seja feita de forma mais simplificada do que a modalidade de concessão pública.